Função Executiva e Desenvolvimento Emocional


Universidad de Granada, EspanhaaBasque Center on Cognition, Brain and Language, Espanhab

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Introdução

O desenvolvimento emocional envolve o aumento da capacidade de sentir, entender e diferenciar emoções cada vez mais complexas, bem como a capacidade de autorregulá-las, para que o indivíduo possa se adaptar ao ambiente social ou atingir metas presentes ou futuras. Muitas vezes, as crianças enfrentam situações em que devem escolher entre opções conflitantes, como terminar a lição de casa antes de brincar ou comer uma guloseima naquele momento, ao invés de esperar para ter uma refeição saudável. Ao tomar tais decisões, elas precisam conciliar o conflito entre escolhas disponíveis que se opõem no contexto de um conjunto específico de expectativas e regras, bem como controlar os impulsos para a gratificação imediata em benefício de uma escolha que é menos imediata e automática. Esse tipo de controle comportamental e cognitivo está relacionado ao conceito das funções executivas. As funções executivas são processos multidimensionais de controle cognitivo que se caracterizam por serem voluntários e exigir um alto esforço. Eles incluem a capacidade de avaliar, organizar e alcançar metas, bem como a capacidade de adaptar o comportamento com flexibilidade ao ser confrontado com novos problemas e situações. As evidências do desenvolvimento cognitivo e da neurociência cognitiva do desenvolvimento têm demonstrado que o desenvolvimento da regulação da emoção é fortemente apoiado por diversas funções executivas essenciais, tais como o controle da atenção, a inibição de comportamentos inadequados, a tomada de decisão e outros processos cognitivos elevados que ocorrem em contextos emocionalmente exigentes.1,2 

Tópico 

Como os seres humanos são predominantemente sociais, entender suas próprias emoções e a dos outros é uma habilidade importante e uma boa parte do cérebro é dedicada a isso.3 As emoções básicas, como a alegria ou o medo, diferem das emoções chamadas morais (por exemplo, vergonha, culpa, orgulho, etc.), que surgem nas interações sociais, onde existem normas ou um comportamento ideal estabelecidos de forma implícita ou explícita. Compreender e administrar as emoções morais exige uma internalização das normas e princípios morais compartilhados pela comunidade. Também é necessário perceber e entender as emoções das outras pessoas (empatia) e fazer atribuições de seus estados mentais (teoria da mente), incluindo a compreensão de suas crenças e atitudes. Dessa forma, o desenvolvimento emocional e social estão estreitamente vinculados entre si.  Outro componente importante do desenvolvimento emocional, ou seja, a regulação da emoção, não é menos importante para a socialização. Nas atividades sociais (por exemplo, na escola), muitas vezes é necessário controlar as reações emocionais, tanto positivas (por exemplo, o entusiasmo) como negativas (por exemplo, a frustração), para que o indivíduo possa se adaptar às normas e aos objetivos. Portanto, o desenvolvimento do controle executivo é fundamental para a regulação da emoção.  

Problemas

A função executiva, muitas vezes, é considerada uma parte geral da função cognitiva. Isso significa que ela está envolvida na regulação todos os tipos de comportamentos, tais como aqueles que envolvem a linguagem, a memória, o raciocínio, etc. No entanto, alguns autores têm sugerido que o comportamento emocional, social e motivado (por exemplo, decidir-se entre comer um pedaço de bolo ou abraçar um ente querido) pode ser mais difícil de controlar e até mesmo exigir um tipo diferente de mecanismo em comparação com condições emocionalmente neutras (por exemplo, decidir se cinco é um número par ou ímpar). Alguns autores estabeleceram uma distinção entre os aspectos "frios" (puramente cognitivos) e "quentes" (afetivos) da função executiva.4 Assim, na resolução de problemas volta para uma meta, a função executiva e a regulação da emoção têm uma relação recíproca. No entanto, os requisitos específicos da regulação da emoção dependerão da importância motivacional do problema e de se o próprio problema é “quente” ou “frio”.1 

Contexto do estudo

A natureza multidimensional da construção da função executiva contrasta com a ausência de um acordo específico sobre um teste padrão de excelência das funções executivas, apesar da natureza altamente estruturada das tarefas tipicamente usadas para examinar as cada uma das diferentes funções. Por isso, utiliza-se uma grande variedade de tarefas de laboratório para medir as diferentes funções executivas, sendo que algumas das tarefas são uma adaptação daquelas utilizadas com adultos. Uma distinção geral entre as tarefas de função executiva “frias” e as “quentes” pode ser feita, dependendo de se a tarefa envolve lidar com informações emocionalmente relevantes ou não.5 Dentro dessa classificação geral, as tarefas podem ser divididas também de acordo com a função específica objetivada, por exemplo, memória de trabalho, controle inibitório ou flexibilidade mental. No entanto, considerando o desenvolvimento prolongado da função executiva durante toda a infância, uma grande variedade de tarefas estão disponíveis, sendo elas apropriadas para crianças de uma determinada faixa de idade ou nível de habilidade.

Principais questões para estudo

  1. O desenvolvimento emocional é apoiado pelo amadurecimento das habilidades associadas às funções executivas? Como é o desenvolvimento dos principais aspectos do desenvolvimento emocional (por exemplo, a empatia, a teoria da mente, a internalização dos princípios morais, etc.) relacionados ao amadurecimento do córtex pré-frontal? 
  2. Quais são os fatores que determinam o desenvolvimento das habilidades associadas às funções executivas? 
  3. As diferenças individuais no desenvolvimento da função executiva e da regulação da emoção são determinadas pelos genes, ou estão vinculadas à experiência? 
  4. É possível promover o desenvolvimento da função executiva por meio de intervenções educacionais? Caso sim, a função executiva melhorada poderia resultar num melhor desenvolvimento emocional?

Resultados de estudos recentes

As evidências de diversos estudos indicam que o amadurecimento dos aspectos do funcionamento executivo, tais como o controle inibitório e a atenção executiva, está fortemente relacionado com o aumento da compreensão emocional (de si mesmo e dos outros) e à regulação emocional. O desempenho das crianças em idade pré-escolar nas tarefas de laboratório que avaliam o controle inibitório correlaciona-se significativamente com sua capacidade de regular suas emoções.7,8 Além disso, as crianças com capacidades de controle de atenção superiores tendem a lidar com a raiva utilizando métodos verbais não hostis, ao invés de métodos claramente agressivos.9 O maior autocontrole (do inglês “effortful control”) também se correlaciona positivamente com a empatia.10 Demonstrar empatia em relação às outras pessoas exige a interpretação de seus sinais de aflição ou de prazer. De fato, a capacidade do indivíduo de distinguir entre seus próprios e os estados mentais dos outros indivíduos (Teoria da Mente, ToM), que é outro componente cognitivo central da empatia,11 está fortemente associada às diferenças individuais de autocontrole e de controle inibitório.12 No entanto, os estudiosos ainda não chegaram a um acordo se a ToM está diretamente associada a habilidades mais gerais de regulação da emoção durante o desenvolvimento inicial da criança.13 Além disso, as diferenças individuais no controle executivo estão associadas ao desenvolvimento da consciência, que envolve a interação entre sentir emoções morais e se comportar de forma compatível com as regras e normais sociais.14 Nesse contexto, o controle internalizado do comportamento é maior em crianças com maiores capacidades de autocontrole.15 A interpretação comum é que o autocontrole proporciona a flexibilidade de atenção necessária para conectar os princípios morais, os sentimentos e as ações. 

Além desses estudos, as linhas de pesquisa atuais estão investigando os fatores, tanto educacionais como constitucionais, que influenciam o desenvolvimento da função executiva.  Os estudos de treinamento de diferentes funções executivas em crianças em idade pré-escolar e em idade escolar têm demonstrado benefícios diretos nas habilidades ensinadas, incluindo na atenção executiva,16,17 no raciocínio fluido,18,19,20 na memória de trabalho21, 22,23 e no controle cognitivo.24 

Lacunas dos estudos

É possível que futuros estudos tenham o potencial de iluminar ainda mais a questão das funções executivas e do desenvolvimento emocional. Embora os estudos transversais possam ser muito informativos, os estudos longitudinais são necessários para excluir os possíveis efeitos originados da discrepância individual entre os grupos etários. Portanto, os estudos longitudinais podem fornecer informações importantes sobre o desenvolvimento cognitivo e emocional típico e atípico.25 Outra questão importante, mas ainda não resolvida, é até que ponto as intervenções educacionais destinadas a promover a função executiva podem produzir mudanças estáveis na eficiência desse sistema, tanto em nível estrutural como nos níveis funcionais, ao longo do desenvolvimento. Alguns estudos têm demonstrado a existência de benefícios derivados do treinamento da função executiva no nível da função cerebral durante o desenvolvimento,16,17,22,23 que ainda podem ser observados alguns meses mais tarde, sem treinamento adicional.16 No entanto, serão necessários estudos adicionais para caracterizar ainda mais os benefícios do treinamento ao longo do tempo, e se os benefícios do treinamento da função executiva se transferem para as habilidades de regulação da emoção. 

Conclusões

O desenvolvimento emocional envolve uma maior compreensão das emoções do próprio indivíduo e de outros indivíduos, bem como o aumento da capacidade de regular as emoções baseando-se em metas atuais e regras compartilhadas socialmente. Na função hormonal, considera-se que as alterações desempenham um papel fundamental no ajustamento social e na competência escolar.26, 27 O desenvolvimento adaptável da emoção está vinculado ao bem-estar da criança, enquanto que as dificuldades com a regulação emocional estão relacionadas a perturbações do humor e a problemas comportamentais.27, 28 O desenvolvimento emocional é formado a partir de uma diversidade de habilidades cognitivas, incluindo a capacidade de regular o comportamento com flexibilidade, de forma voluntária, exigindo esforço (função executiva), dependendo fortemente do amadurecimento dos lobos frontais.29 A regulação cognitiva e emocional parecem se desenvolver em conjunto, exibindo um forte desenvolvimento durante o período pré-escolar e um curso de desenvolvimento mais demorado durante a infância posterior e adolescência.30 

Consequências para os pais, serviços e políticas

Um número de evidências cada vez maior sugere que a função executiva pode ser melhorada através de treinamento cognitivo e que essas intervenções têm o potencial de melhorar a eficiência dos sistemas cerebrais, servindo de base para as habilidades de regulação comportamental e emocional nas crianças,16 assim como nos adultos23, 31,32 Alguns estudos recentes também demonstram que o desenvolvimento do controle executivo é afetado por fatores ambientais, como a educação proporcionada pelos pais e a escolaridade. A qualidade das interações entre pais e filhos na primeira infância parece estimular o desenvolvimento da função executiva mais tarde. As atitudes dos pais, tais como a afetividade, a receptividade e a disciplina pacífica, que estão relacionadas para garantir o vínculo entre pais e filhos e uma reciprocidade positiva, estão vinculadas às habilidades avançadas da função executiva na criança.33 Da mesma forma, os currículos escolares que se concentram em ensinar habilidades de regulação têm proporcionado um aumento significativo do desenvolvimento do controle executivo na idade pré-escolar.24 A plasticidade do sistema neurocognitivo subjacente da regulação cognitiva e emocional poderia estar relacionada ao seu amadurecimento prolongado durante as duas primeiras décadas de vida. É importante ressaltar que a suscetibilidade desse sistema neurocognitivo que pode ser influenciado por uma ampla gama de experiências oferece múltiplas oportunidades de estimular a competência social e emocional das crianças Os dados dos estudos resumidos neste artigo devem encorajar os responsáveis pelo planejamento e estabelecimento de políticas a promover o uso de programas educacionais que incluam em seus currículos a abordagem direta da competência sócio-emocional.

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Para citar este artigo:

Rueda MR, Paz-Alonso PM. Função Executiva e Desenvolvimento Emocional. Em: Tremblay RE, Boivin M, Peters RDeV, eds. Morton JB, ed. tema. Enciclopédia sobre o Desenvolvimento na Primeira Infância [on-line]. https://www.enciclopedia-crianca.com/funcoes-executivas/segundo-especialistas/funcao-executiva-e-desenvolvimento-emocional. Publicado: Janeiro 2013 (Inglês). Consultado em 26 de dezembro de 2024.

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